As pessoas já comentavam que o mundo iria acabar, mas nunca sabíamos se acreditávamos ou não. Era insensato crer em coisas como essa, mas não achávamos que quem acreditava estava ficando realmente louco. Isso era porque em nossa cidade já começava a chegar sinais de fim do mundo. O primeiro sinal foi o calor, calor excessivo. Quase não se conseguia andar nas ruas, as pessoas bebiam muita água e gastavam seus salários para se refrescar. Eram condicionadores de ar, ventiladores, sorvetes, bebidas geladas e protetores solar. O dinheiro já não era suficiente e a vida estava um inferno. A temperatura ia subindo cada dia mais. Já estava acima de 40°C e não parava de aumentar. E então começou a faltar água na cidade. Diziam-nos que era problema com as bombas de água nas ruas, mas eu tinha quase certeza que não, porque a água era ligada três vezes por dia por alguns minutos. A verdade era que, muito provavelmente a água da cidade estava acabando. Não chovia à muito tempo, estava tudo seco, todas as flores que ficavam ao sol e algumas árvores. Aí então diminuíram para duas vezes ao dia a água da cidade. Nisso a temperatura já era de em média 45°C e as pessoas já procuravam não sair mais de casa. E os termômetros da cidade subitamente se estragaram, não se sabe como e nem porquê, simplesmente pararam de pegar. Ninguém soube dizer o que havia ocorrido, mas todos sabíamos que cada dia a cidade estava mais quente. Então começaram as mortes. Com a falta de água e alta temperatura as pessoas morriam de insolação, desidratação, câncer de pele. Os hospitais estavam em estado precário com a situação e não conseguiam mais atender a população. Havia muitas, muitas mortes todos os dias. Certo dia olhei pela janela e vi vários raios alaranjados vindos dos céus, atingindo a cidade, mas nada era danificado. Fiquei em minha casa, seria melhor ficar longe do sol a uma altura dessa. Seria aquilo um alto nível de radiação? - me perguntei. Já estava fraco por falta de água e não queria me submeter ao sol. Fiquei na parte mais escura em minha casa, deitado, esperando que aquilo fosse um pesadelo. Encharcado de suor. Esperando aquilo acabar, ou anoitecer para poder buscar mais água. A água era extremamente escassa e a distribuição era feita por postos de saúde em garrafões, únicos lugares onde ainda recebia um pouco de água na cidade, o resto foi completamente cortado. E desmaiei. Quando acordei no dia seguinte, o dia estava um pouco menos quente e havia algumas marcas de sombras de pessoas em cinza no asfalto. Era assustador imaginar seja lá o que tivesse acontecido. Mas havia salvado minha vida. Dia a dia a cidade muito lentamente ia voltando ao normal. O sol já não queimava tanto e havia mais água. Apesar do calor, chovia. E algumas pessoas desaparecidas naquele dia laranja nunca mais foram encontradas.
- Araraquara, Outubro/Novembro de 2012